Ontem fomos milhares - crianças, jovens, adultos, idosos, famílias inteiras - a prestar homenagem ao cidadão Odair Moniz abatido numa operação policial e a exigir justiça pela paz. A manifestação foi convocada pela organização "Vida Justa" e foi um acontecimento histórico e exemplar: apesar do sentimento profundo de injustiça e revolta, não se viu o mais pequeno sinal de violência ou manifestação de ódio. Antes, serviu para dar voz aos moradores dos bairros em questão que, nos últimos dias, não apareceram nas televisões nem nos jornais para comentarem e participarem nas reflexões de que são o tema principal. Se esta ausência não é a prova evidente de que classe social e cor da pele estão profundamente ligadas na exclusão de pessoas em Portugal, então não sei o que é.
A manifestação de ontem mostrou, com um civismo e uma elevação sem paralelo na sociedade portuguesa, que acabou o tempo dos debates e reflexões intelectuais sobre os problemas "dessa gente" (é assim que a população dos bairros é designada tantas vezes por quem governa e opina à distância e com "pinças") sem que a mesma esteja representada e tenha poder decisório.