sexta-feira, 11 de setembro de 2020

Uma lição em capitalismo selvagem

 

É mesmo uma lição em capitalismo selvagem, a entrevista ao empresário Álvaro Covões - presidente da “Everything is New” entidade promotora do festival NOS ALIVE - no programa da RTP3, “Tudo é economia” (7/7/20). Espreitem este excerto:


P: “Como é que tem visto a actuação da ministra da cultura neste processo, ela que tem sido alvo de tantas criticas no sector?


R: Há dois sectores: há as pessoas e depois há as empresas. Mas as empresas também têm empregados. No que diz respeito às empresas, como vemos, o anunciado apoio à cultura não é um apoio à cultura. É um apoio a trabalhadores independentes e a artistas e a entidades não lucrativas. Os apoios que estão disponíveis são esses e portanto as empresas foram todas deixadas para trás. E assim vai ser difícil. Nós sabemos que a economia faz-se é com empresas, não se faz com trabalhadores independentes.”


Esta é a lógica que defende a entrega da gestão da cultura (e tudo o mais) aos privados. Isso representaria o fim de um apoio garantido e continuado à investigação, à música contemporânea, às edições alternativas, à experimentação e por aí fora, ou seja, a todas as áreas da actividade artística que não sendo lucrativas, segundo esta lógica, não contam. 


Esta é a lógica do afunilamento das opções que garante apenas o enriquecimento de uns à custa do empobrecimento de outros, ao mesmo tempo  que arraza a diversidade, estagna o desenvolvimento da cultura, limitando-a ao propósito comercial e assim, transformando-a noutra coisa qualquer. Uma ideia predatória.


Eu defendo o contrário: um aumento relevante para valores realistas da fatia para a cultura no orçamento de estado e politicas que mostrem claramente que os governos democráticos conhecem, protegem e garantem a diversidade cultural para que não se caia na situação de ficarmos ainda mais limitados e dependentes exclusivamente das vontades, gostos e sede de mais e mais lucro de meia dúzia de empresários.


O que não faz mesmo sentido na resposta do empresário Álvaro Covões é que dentro da sua lógica capitalista, venha agora, na crise da pandemia, pedir socorro ao Estado. 


E fê-lo com afirmações provocatorias que só pretendem dividir o sector: “Nós sabemos que a economia faz-se é com empresas, não se faz com trabalhadores independentes.”


Chocante mas bem real.

Sem comentários:

Enviar um comentário